ISABELA ANDRADE DE LIMA MORAIS
(Doutora em Antropologia. Professora Adjunta do Departamento de Hotelaria e Turismo da Universidade Federal de Pernambuco)


As discussões sobre patrimônio e museus estão atualmente relacionadas ao fenômeno do turismo. Nas últimas décadas percebeu-se que o turismo pode ser um grande aliado na preservação do patrimônio material e intangível e os museus integram-
se como recursos essenciais ao desenvolvimento do turismo cultural. A problemática desse fenômeno é como turistificar esses espaços sem que eles percam suas funções de lugares onde é possível dialogar com a alteridade e com a sua própria identidade sociocultural. Essas discussões nortearam uma pesquisa que está sendo desenvolvida no
Departamento de Hotelaria e Turismo da UFPE, com a finalidade de discutir as relações entre patrimônio, museus e turismo. Para isso estamos realizando pesquisas no Museu do Homem do Nordeste e na Casa Museu Magdalena e Gilberto Freyre, ambos localizados em Recife/PE, com o objetivo de refletir sobre os impactos que turismo provoca no processo de patrimonialização e musealização. Inicialmente estamos identificando o perfil dos turistas culturais, suas expectativas e avaliações sobre os espaços museais, a fim de identificar as fronteiras resultantes do processo de turistificação do patrimônio e dos museus. Sendo o turismo um fenômeno inevitável, propomos discutir o conflito resultante do processo de turistificação dos patrimônios e
dos museus de forma a minimizar os impactos negativos e contribuir para a inserção desses locais como equipamentos do turismo cultural e como roteiros turísticos de destinos culturais.

Os resultados das pesquisas no MUHNE e na Casa Museu indicaram que a faixa etária dos visitantes é predominantemente jovem (de 19 a 45 anos de idade), reforçando as análises da pesquisa ATLAS de que o perfil dos turistas culturais é composto, em sua
maioria, por pessoas jovens e que tem a aspiração de “descobrir outras culturas”, conforme apontou Richards (2009, p. 30):

O mercado jovem é importante para o turismo cultural, não só porque
as pessoas visitam atrações culturais quando são jovens (e muitos
utilizam cartões de descontos para jovens), mas também porque as
experiências culturais que vivenciam no período de sua juventude
podem influenciar o seu comportamento futuro, no âmbito do turismo.
Essa conclusão que o turismo cultural é composto por consumidores jovens é sugestiva, já que se acreditava que o público dos museus era composto por pessoas de mais idade, então a conclusão de que o mercado do turismo cultural é um mercado jovem permite aos museus desenvolver ações, projetos, marketing e políticas para atrair esse segmento.

O nível de escolaridade dos turistas visitantes do MUHNE e da Casa Museu é composto pessoas de nível superior ou pós-graduado, esse dado corrobora com as conclusões da pesquisa ATLAS que indica que os turistas culturais são pessoas jovens, estudantes, com nível educativo alto:

“Uno de los motivos por los que los jóvenes viajeros, y especialmente
los estudiantes, son importantes para el turismo cultural es el estrecho
vínculo entre consumo y educación. La gente con un nivel educativo
alto tiende a consumir más cultura, y no sólo alta cultura, sino también
cultura popular. Una de las principales causas del crecimiento del
turismo cultural en estas últimas décadas ha sido, por tanto, el
incremento de los índices de educación un nivel educativo muy alto.
Más de la mitad tiene algún tipo de estudios superiores, comparado
con aproximadamente un tercio del total de la población de la UE”
(Richards, 2005, p. 04).

Os resultados das pesquisas no MUHNE e na Casa Museu também demonstram que em relação à forma de obtenção de informações sobre o museu, o item

“comentários de amigos e parentes” aparece como o mais citado em relação a: “informações turísticas”, “sugestões de guias, agências de viagens”, “já conhecia o local” e “mídia: propaganda/publicidade”.

Esses resultados também estão em consonância com as pesquisas ATLAS ao demonstrar que a recomendação de amigos e familiares é a principal forma que os turistas culturais encontram para obter conhecimento sobre os equipamentos do turismo cultural. 41% dos turistas do Museu do Homem do Nordeste e 37% dos turistas da Casa
Museu obtiveram conhecimento sobre os museus através de comentários de amigos e parentes. A pesquisa ATLAS de 2002 indicou que 46% de turistas culturais obtêm conhecimento sobre os equipamentos através de recomendações de amigos e familiares,
em 2004 a principal fonte de informação continuou sendo a recomendação pessoal de amigos e familiares (45%). Esses resultados servem para reforçar a necessidade de garantir a satisfação do visitante para que haja um wold-of-mouth positiva, além de servirem de referências para futuras ações de marketing turístico, corroborando para o desenvolvimento do marketing colaborativo no destino para o desenvolvimento do turismo cultural, reforçando a ideia de investimento publicitário e propagandístico entre
o público autóctone, já que é este que alimenta a cadeia de divulgação dos equipamentos do turismo cultural, incluindo os museus.
Se compararmos a taxa de visitação dos museus envolvidos na pesquisa às taxas de visitação dos museus internacionais, veremos que os museus no Brasil ainda possuem uma baixa visitação. Nos quatro meses de pesquisas no MUHNE apenas 137 turistas visitaram esse espaço, na Casa Museu esse número ainda é menor, somente 45
turistas visitaram este museu. Como o Sistema Unificado de Pesquisa de Público em Espaços Museais de Pernambuco ainda está sendo utilizado e analisado, não é possível
identificar os motivos da baixa visitação aos museus, porém sabemos que para atrair os turistas, os museus devem possuir exposições que são constantemente renovadas, recursos humanos especializados no atendimento a diferentes tipos de públicos (turistas,
idosos, crianças, etc.), livrarias, lojas com vendas de souveniers, restaurantes ou cafeterias (Vasconcellos, 2006, p. 39). Gomes (2009, p. 27) elenca alguns elementos constantes no espaço museológico para atrair os turistas:

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não é de hoje que a relação entre museus e turismo cultural é desenvolvida. O México é um exemplo paradigmático onde essa relação é explorada. O Museu Nacional de Antropologia, o Museu do Templo Maior, as ruínas de Teotihuacán, além dos inúmeros museus regionais e museus a céu aberto são paradas quase que obrigatórias para quem visita o país e principais atrativos da indústria do turismo. Outros exemplos são significativos como o British Museum, em Londres; o Louvre, em Paris; o Metropolitan Museu, em Nova York e o Museu do Prado, na Espanha. No Brasil ainda são muitos os conflitos decorrentes do processo de turistificação dos museus. A percepção dos museus a partir da perspectiva pedagógica é muito presente nas discussões museológicas, pensar os museus a partir da perspectiva turística

ainda é muito embrionário e distante no Brasil, apesar da existência de políticas públicas que apoiam a relação entre turismo e museus.
É extremamente compatível a aliança da função pedagógica com a função turística dos museus, pois uma não inviabiliza a outra, afinal o turista quando visita um museu está aprendendo sobre o outro, tendo o choque cultural como o fator de atratividade, já que a atração turística dos museus é o exercício da experiência cultural,
ou seja, a apreensão e a busca do “algo mais”, algo que agregue valor perceptível, sensações ímpares que incorporam características de emoção (Panosso Netto & Gaeta, 2010). Portanto, é possível turistificar os museus sem que eles percam suas funções de lugres onde é possível dialogar com a alteridade.
É preciso perceber que o processo de turistificação dos museus contribui para a conservação, valorização e preservação do patrimônio natural e cultural, da memória,
das identidades e da cultura de uma coletividade, além de promover experiências inesquecíveis para os turistas e visitantes, já que museus possibilitam a consolidação
dos quatro fatores do turismo de experiência segundo Pine e Gilmore (1999), que são:

educação (aprendizado sobre a cultura), entretenimento (através da oferta do lúdico e da diversão), estética (através do visual) e evasão (através da perda da noção do tempo e da temporalidade).
As perspectivas contemporâneas consideram que a relação entre museus e turismo pode ainda produzir perspectivas de geração de renda que garantam a sustentabilidade econômica dos museus e a geração de fluxos econômicos das comunidades ao seu entorno. Essa é a base da perspectiva da economia criativa dos museus. Para isso, o Museu Guggenheim, em Bilbao, é um exemplo paradigmático, pois
sua implantação serviu para recolocar essa cidade do país basco espanhol nos mapas de destinos turísticos. Quando o museu foi implantado, Bilbao estava com a infraestrutura desgastada e com a reputação abalada pelo terrorismo, o Museu Guggenheim serviu
para revitalização da cidade, atraindo atividades que “deram vida” à cidade, através da emergência de extraordinária atividade urbana e do surgimento de bares e restaurantes, além da criação de diversos empregos para os residentes, promovendo o desenvolvimento da cidade.

ISABELA ANDRADE DE LIMA MORAIS: Doutora em Antropologia pela Universidade Federal de Pernambuco (2009), possui Mestrado em Antropologia pela UFPE (2004) e Graduacao em Historia pela UFRPE (2000). Atualmente é Professora do Programa de Pós-Graduação em Hotelaria e Turismo da UFPE, Coordenadora do Curso de Turismo da UFPE e Professora Associada II da UFPE, lecionando no Departamento de Hotelaria e Turismo. Foi Professora Colaboradora do Mestrado em Tecnologia e Gestao em Educacao a Distancia da UFRPE (2012). E pesquisadora os Seguintes Grupos de Pesquisa do CNPq: ANTUR - Grupo de Pesquisa em Antropologia e Turismo (UFS-UFPE), LETs - Laboratorio de Estudos Turisticos (DHT-UFPE) e ECOS (DHT-UFPE). Faz parte do corpo editorial da revista Anais Brasileiros de Estudos Turisticos (2012). Participou como avaliadora de editais junto ao Ministerio da Cultura (MinC) e Fundacao do Patrimonio Historico e Artistico de Pernambuco (FUNDARPE). Coordenou pesquisas, apoiada pelo CNPq, sobre economia criativa nos museus e sua relacao com o fenomeno turistico. Tem experiencia na area de Antropologia, atuando principalmente nos seguintes temas: Antropologia e Turismo, Patrimonio, Memoria, Identidade, Museus, Economia da Cultura e Economia Criativa e Antropologia da Morte.