“Puro espaçamento”

Vou tentando pintar aqui com letras pretas o espaço branco da tela do computador na esperança de produzir “um rasgo” nesse virtual papel. Parto da premissa que para interpretar o que acontece na arte contemporânea nesse Brasil de 2021 é necessário primeiramente mapear os referenciais teóricos usados pelo circuito de arte do país.

​Intrinsecamente estamos ligados aos preconceitos e às convicções que a experiência se atém, portanto todo o repertório que aqui possamos reivindicar como pertencente ao modo de fazer arte contemporânea logo se dá na forma como nos apropriamos dele.  

​Como se as mãos que estão digitando fossem automatizando algo que já está sendo gestado pelo circuito e legitimado por ele, como se as imagensalém de terem uma certa direção guiassem o caminho na adoção de determinadas palavras como forma de compreensão e de ação no mundo da arte.

Significativa a palavra camada que advém do mundo teórico (da arqueologia de Foucault) e que invade a forma como a interpretação se dá no circuito de arte contemporânea brasileira. Sabemos que ela não é apenas uma maneira de interpretar, mas uma forma de conduta que tudo arrasta e tudo envolve na produção do trabalho de arte.

É claro que quando mais me aproximo de um ponto de vista que possa dar conta de uma certa totalidade do fazer, algo passa a ser ou não-ser de um modo ou de outro, isso porque o escorregadio “jogo de significações” também opera como se fosse um distintivo assegurador dos espelhos que refletem tantos caminhos na feitura dos trabalhos.

Então, qualquer tentativa de totalizar e generalizar fique fadada ao fracasso. Nisso podemos entender que há um puro espaçamento entre o dito e o feito, entre os conceitos que vigem na apreensão e a vida quer jorrar.

ALINE REIS | 10 agosto 2021