Sobre o Pensamento Decolonial

      Embora o colonialismo histórico tenha acabado, ele permanece no colonialismo epistemológico e na exploração econômica, o que incide sobre os comportamentos nas zonas de sociabilidade metropolitana. O pensamento de Boaventura Santos explicita bem isso, quando evidencia os três tipos de dominação moderna (capitalismo, colonialismo e patriarcado).

O reconhecimento da linha abissal é condição indispensável para tratar metodologicamente a questão das exclusões abissais e não-abissais. A linha estabelece uma demarcação entre a zona do ser e a do não-ser (questão ontológica desenvolvida por Maldonado-Torres), respectivamente, o norte e o Sul, de um lado o regime de regulação e emancipação e de outro, de apropriação e violência. Enquanto o primeiro se alicerça nas teorias universais (validade do conhecimento, linearidade, classificação social, superioridade do universal e do global e a produtividade), o segundo tem seus conhecimentos desmerecidos (oral, senso comum, ametódico). Enquanto no Norte há uma concepção de humanidade alicerçada emancipada numa maioridade jurídica e filosófica, herdeira do humanismo renascentista, seguida do iluminismo, no outro lado da linha temos a sub-humanidade.

      Franz Fanon “denunciou a linha abissal entre a metropolitanidade e a colonialidade e os tipos de exclusão que ela cria”. ¹ A linha abissal assinala tais disparidades entre a sociabilidade metropolitana e a sociabilidade colonial, portanto os sociólogos que não percebem tal regime de exclusões só legitima a cegueira ideológica da opressão que também é política. Os mecanismos políticos do mundo metropolitano são o Estado liberal, o Estado de direito e a democracia, enquanto no mundo colonial e neocolonial estão o apartheid, o trabalho forçado e o trabalho escravo, a eliminação extrajudicial, a tortura, a guerra permanente, a acumulação primitiva do capital, os campos de refugiados, a dronificação do conflito militar, a vigilância das massas, o racismo, a violência doméstica e o feminicídio.

¹ SANTOS, Boaventura de Souza. O Fim do império cognitivo. Belo Horizonte: Autêntica, 2020, p.42

ALINE REIS | 6 dezembro 2022