Conversas de arte

Numa conversa de arte somos todos convidados a interpenetrar concepções. Na arquitetura redonda da sala expositiva do Centro Cultural dos Correios, como numa grande arena, somos todos tomados por um objetivo comum: pensar o trabalho de Marilou Winograd.

​A roda logo se estabelece na fala do curador Alexandre Murucci e do artista convidado John Nicholson sobre a exposição “Janelas Indiscretas: eu vejo o que você vê?” e as contribuições são dadas partindo de pontos de vista geométricos, conceituais, vivenciais e teóricos. A linhagem constituitiva aponta para uma geometria de longa tradição moderna brasileira e há remissão aos pintores que retrataram a solidão. 

Muitos são os artistas que aparecem nas diversas janelas. As fotografias feitas na pandemia estão dispostas em vários formatos e muitas são manipuladas posteriormente em cores num prenúncio de novos tempos. Os enquadramentos rígidos das caixas (na centralidade da sala há uma com profundidade que traz os olhos da artista) até aos voils que as dissolvem.

​A autorreferencialidade dos “objetos” dispostos são uma marca da arte contemporânea no entendimento de como o espectador tem pistas para fruir o espaço pretendido pela artista. A intencionalidade curatorial também desenha no texto e na disposição dos trabalhos uma outra camada de provisão.

​Como tudo está fora, prenúncio enunciativo de Bachelard e da fenomenologia husserliana, o tempo histórico nos retirou de uma arquitetura da intimidade e nos jogou no estranhamento de um mundo em crise. Se no século anterior, a estrangeiridade era um recurso literário, uma conversa niilista dos filósofos que já anteviam o mundo da técnica, nós a experimentamos em sua aspereza no dia a dia de nossa cotidianeidade.

É muito bom voltar a olhar tão tenebrosos dias tendo como aporte as referências da arte. A tradição nos lega um caminho tranquilizador. Precisamos de nossas catalogações para que o frescor do mundo da vida continue a soprar os ventos da história

ALINE REIS | 5 julho 2022