Posicionar a imagem

​Eu já havia pensado em extrair uma imagem dos textos que vinha lendo, quando entrei num grupo de arte contemporânea que me propôs tal coisa. Aí fiz o exercício e percebi que as minhas imagens (e discussões) não eram compatíveis aos novos textos propostos, porque não trato dessas questões como centrais no meu trabalho de pensar a arte. O exercício então me proporcionou experimentar a diferença.

Muitas coisas apareceram desta constatação. As imagens que posiciono ao meu pensar estão submetidas a quais relações? É possível “fazer uma imagem”? De onde vem a inspiração? Vem de um repertório já próximo?Constituir uma imagem como imagem revela esbarrar na significação e na força da história “subjetiva” e “objetiva”.

Do exercício nasceram uma foto (a imagem como constatação) que mostra as vizinhanças possíveis ao texto de Jota Mombaça (foto de outros livros que se entrelaçam em temáticas afins) e do texto de Valter Hugo Mãe a imagem de um quebra-cabeça com o dizer “A lógica as verdades em categorias” como forma de operar a antítese. Posicionei a presença do pensamento racional que ainda habita (por detrás) o monstro-mundo.

O gosto amargo na boca de ter feito o exercício diz respeito a constatação de que as imagens posicionam o meu pensar e não ao contrário.Significa dizer que antes mesmo de lidarmos com as imagens como meras superfícies bidimensionais, de apenas clicá-las e contemplá-las (Flusser), nós as escolhemos e vivemos nela sem qualquer questionabilidade.

​Certa vez, no início dos anos 90 do século passado, perguntei a um amigo ator que fazia a peça de Moacyr Goés o que era a imagem que ele criara no fim da peça Escola dos Bufões. Levei um esporro. Não se perguntava sobre isso. A imagem não podia ser interpretada sequer. Passado trinta anos, o tempo histórico é outro. A conjuntura técnica posiciona a produção das imagens que devem ser esgotadas (até a exaustão)!

ALINE REIS | 21 setembro 2021