“Notas para um portifólio

​Os percursos que um artista (ou um não-artista) faz são matéria para o seu portifólio. Proponho alargar os caminhos para inserção de uma série de fatos. A paixão pela arte contemporânea continua a ser a razão de todas essas loucuras que proponho aqui. O começo é a vontade de manter acesso a algo que ainda se mantém e continua a ressoar mesmo quando passo pela quina da parede expositiva, mesmo quando fecho o livro que estou lendo…

Entre a complexidade histórica e o protagonismo dos artistas no processo de moldar o fazer da arte contemporânea salta aos olhos o fato de que os “motivos” e os interesses foram sendo “achados” em todos os lugares, principalmente, em lugares de não-arte como assinalou Kaprow¹. Isso significa dizer que definitivamente algo que deveria estar fora entrou no circuito da arte.

O limitante diagnóstico da “hiperconsciência de si mesma e de seus arredores cotidianos” é incontestável, embora ainda haja fôlego para outras investidas. Difícil é passar da barreira linguística e da visão de mundo que os textos de arte (de Estética e de Filosofia da Arte em outros momentos) nos impõe. Ao surgir no horizonte as várias quebras (novas mudanças de direção)que engendram o nosso repertório, temos a impressão de não ter mais para onde ir… Como dar esse salto?

​Vemos que os teóricos em suas teses usam a visualidade do trabalho (tese) como se estivessem manipulando um trabalho (de arte), curadores lidam curatorialmente com a hipótese da exposição levando em consideração todos os agentes envolvidos (trabalho de todos que colocaram em pé a exposição) e as várias camadas que passam a aparecer são incorporadas ao “trabalho”. Não mais obras de arte, e sim trabalhos de arte. 

​Significa dizer que para além da dimensão ideológica do tratamento dado à arte (outro assunto importante), os arredores do mundo passaram a ser significativos na visualidade do fazer na arte contemporânea. Então, mesmo o portifólio passa a ser “visto” como uma possibilidade de trabalho e nele cabe tudo. Forcemos o inatingível que ressoa no espectador.

ALINE REIS | 15 junho 2021

¹A vontade de criar um portifólio dialoga com o texto de “A educação do não-artista”, de Allan Kaprow.