Caminhos pontilhados

            Como as diversas artes são distintas entre si, a matéria de cada uma chega ao receptor completamente diferente também. A recepção da literatura feita pelo leitor enviesa a personagem, imagina que tais palavras possam ser mesmo do autor ou não, afinal como a matéria da prosa é a palavra, fica mais latente enxergar o que se quer, deduzir, inferir, tomar para si o Outro nele mesmo, num divã ou num tribunal de expectativas.

Difícil interpretar o léxico do artista visual, mesmo que seja essa uma das funções do curador, ainda existe muito diálogo até “dominar” as letras, os vestígios, os rabiscos, as cores, as posições etc. etc. E não se domina tudo é proibido achar que dominamos tudo, como se tudo estivesse para ser “lido”, “visível”, em descoberto.

            Fica-se no meio do caminho pontilhado e como são vários os artistas que vamos conhecendo os caminhos todos são pontilhados… é claro que juntos numa mesma curadoria, os pontilhados vão se somando e convergindo, num termo bem preciso: dialogando. A conversa se dá de todos os âmbitos, espacialmente, temporalmente, inclusive em lacunas dadas pelos próprios que não sabem eles mesmos preencher os espaços sozinhos.

            Essa totalidade que quer o filósofo, nada agrada o artista. Balbucia, dada, age sem fechar a ideia ou a ação, fica-se assim no meio do caminho, sem o tudo, sem o nada, sem o narrar, sem o pontual, sem o centro da parede, um pouco tombado, um pouco inaudito, esfinge, rasura. A última fronteira desconstrução. Faz-se de tudo para ir para frente, sem que o afrente esteja dado e sabido. São os “vanguarda” paradoxalmente avançam, sem avançar…

Para que está acostumado a estar nas piores posições de observação e vigília, tudo bem, não se descansa, quase se arrasta. Pura terra, puro contato, porque nem a pureza pode! É um mito.

ALINE REIS | 7 novembro 2023