
Aproximações de superfície
Por mais que possamos aproximar as artistas de uma exposição há abismos que “participam” da aproximação dos trabalhos. Isso aconteceria em qualquer arte de qualquer tempo, porque a forma como que cada uma propõe a visualidade e uma determinada “temática” (um quê de acadêmico muitos de nós ainda guarda), é significativa.
O processo de costurar fios narrativos e de “encostar” formas e cores umas com as outras, dependendo de onde estão ancoradas as intencionalidades também atravessa oolhar do curador numa miríade de caleidoscópio. O curador se está voltado ao mundo teórico ou ao mundo da história da arte, ou em ambos (não são excludentes), tenta vencer a superfície que se apresenta.

É um certo mistério adentrar no circuito de arte e se espantar com quantas mãos e proposições no fazer e no apresentar dos trabalhos de arte pode caber numa exposição. Os aficionados tentam “segurar” algumas expectativas e um cabedal conceitual, mas a arte se comporta como água escorregando de qualquer tentativa prévia.
A exposição Superfícies se Aproximam foi sendo constituída a partir do encontro das artistas num curso que elaborei sobre a pesquisa em Arte Contemporânea. Uma das obras que nos debruçamos foi A Água e os Sonhos, de Gaston de Bachelard, lá há uma citação referente a Nietzsche e a Schopenhauer evidenciando que “é preciso adivinhar o pintor para compreender a imagem.”

Independentemente da amplitude da proposição feita, das distintas “cozinhas” que são articuladas e da água que banha todas elas, adicionamos mais duas outras variáveis: o tempo histórico pandêmico e a nossa condição de gênero e faixa etária. Aoalinharmos o pensamento da goteira que segue buscando uma solução, avançando sobre onde dá, consolidamos não só uma “imagem” dos nossos corpos, mas a forma como fomos instruídas.
No paradigma dominante de crítica ao universal, não podemos fingir que não sabíamos a implicação da falta de espaços para expor, das narrativas enviesadas que nos condicionam a lugares de subalternidade e da pouca visibilidade que nos mantém sob os critérios da dominação masculina. A briga é histórica.
ALINE REIS | 2 maio 2023

