
Terra nos olhos
O texto curatorial apresenta o artista e a obra ao visitante da forma mais clara possível. Isto quer dizer que além de explicitar a visualidade, a curadoria também precisa desobedecer a qualquer ordem totalizante que indique um caminho único e linear na compreensão do trabalho. Amortecer a busca de um só sentido é vital.
Um bom exemplo disso, encontrei na exposição “Os Vivos e os Mortos”, de Jonas Arrabal, no Paço Imperial, em 2019. O espectador ao absorver o impacto do tombamento da Casuarina na sala expositiva, volta-se para o próprio corpo, tendo aquilo que chamamos experiência. A política ecológica não é suficiente para esgotar o horizonte técnico da construção da ilha do japonês em Cabo Frio. A sua artificialidade se projeta para além do mito de que seu proprietário era um oriental e evocar memórias dos churrascos feitos outrora, não aviva o duro sentimento de que somente restos nos esperam hoje.

A experiência da arte longe de se constituir num só discurso, vivifica a potência do corpo em meio as coisas. O estado sensível modificado em relação ao que já estamos familiarizados nos faz sentir a urgência em relação ao mundo que experimentamos. Ficamos lá num lugar imaginário sem que as referências possam nos aprisionar em discursos fáceis.
Se novas combinações recombinam e produzem diferenças para nos perturbar na busca por novos sentidos, costumamos paradoxalmente segurar as coisas pelas pontas. Uma ponta da toalha é o suficiente para tirar a mesa. Desnudar superfícies. A superfície tem a capacidade de velar a geometria. Vários são os caminhos a serem trilhados. A pergunta é: como constituir novos mundos e visualidades a partir de coisas que já estão tão impregnadas de significados? Tatearemos novos formatos constituindo outras experiências mais próximas ao nosso tempo? Tombar junto com a árvore é ainda possuir terra nos olhos.
ALINE REIS | 7 fevereiro 2023
