
Promessa de preenchimento
Um ateliê traz consigo uma promessa de preenchimento! Na rotina vamos “preenchendo” as paredes fazendo surgir associações e novos começos. Significa dizer que os trabalhos vão sendo “depositados” no espaço com toda a força do material que carregam, fazendo com que inaugure uma certa visualidade sobre nossas cabeças. Coisa análoga acontece na curadoria nos dias da montagem. Não é imediato que a coisa se dá. O tempo é um ingrediente essencial na conquista de um lugar que além de privilegiado, é também ganha pão e engendra o processo.

A frontalidade do espaço desenha um mundo a ser discutido na geometria que se pronuncia. Escrevo para alinhavar os fragmentos e as perspectivas que vão se dando, fazendo “funcionar” os conceitos como suporte de arte. Executar as tarefas sem que haja uma regra tão fixa e próxima ao pensamento racional, tanto dá um acabamento temporal como acentua a dificuldade de lidar com um terreno nada fácil.

Ação e falta de ação começam com o corpo? Quando surge uma diferença na repetição? A cosmologia do ateliê harmoniza e dissocia tudo num turbilhão de convergências e divergências que ora repelem ora juntam pedaços, arranjos, composições, resquícios. Preencher o que? Lidamos com a história da arte. Se o chão histórico já se encontra rachado, pisá-lo nos “joga” para um patamar de indeterminação que somente uma pisada forte é possível como entrada naquele ambiente.
Assim entra no ateliê o corpo do artista que já carrega consigo muitas trajetórias como se fosse um marco arquitetônico presente na sala expositiva. Temos que lidar com ele diretamente na expografia relacionando-o como coisa a ser posta em relação, daí os tantos “achados” poderem ser embaralhados e constituídos em novo material. É uma posição mais que capital na conquista de uma narrativa ou de uma visão do que realmente estamos fazendo.
ALINE REIS | 20 dezembro 2022

