Quando a crítica à modernidade é pauta da arte contemporânea

Boaventura dos Santos articula a relação entre o pensamento moderno ocidental e as conquistas do velho mundo utilizando a imagem das linhas cartográficas na geografia. Indissociáveis. Abissais. Impõe uma invisibilidade e uma inexistência não sendo nem relevante nem compreensível, nem mesmo sendo possível uma coexistência entre ambas as linhas (norte e sul). Esse regime de exclusão isola o outro numa “vasta gama de experiências desperdiçadas, tornadas invisíveis, tal como os seus autores, e sem uma localização territorial fixa.”

https://www.jornaldocomercio.com/cultura/2022/08/859997-mostra-que-aborda-questao-decolonial-sera-exposta-na-pinacoteca-da-ajuris.html

O autor enquadra a modernidade ocidental como um paradigma fundado na tensão entre a regulação e a emancipação social. O que fica visível nos conflitos modernos, tanto nos fatos quanto no plano dos procedimentos, e na distinção visível entre as sociedades metropolitanas e os territórios coloniais. Enquanto o primeiro está assegurado por dois grandes domínios, a ciência e o direito, o outro são “os territórios coloniais que constituem lugares impensados ao desenvolvimento do paradigma da regulação\ emancipação” sem direito à universalidade.

​As fundações das relações epistêmicas modernas, coloniais e imperiais, explicações epistemológicas dominantes/hegemônicas forçaram-se num horizonte histórico e social em dois pilares: o pilar da regulação social, constituído pelo princípio do Estado, da comunidade e do mercado e o pilar da emancipação concernente as três lógicas da racionalidade: a estética-expressiva das artes e da literatura, a instrumental-cognitiva da ciência e tecnologia e a moral-prática da ética e do direito.

Criticar a epistemologia moderna e premência das experiências de conhecimento do Norte global sob as epistemologias do Sul faz com que cheguemos à injustiça social global (até hoje) que separa o velho mundo do novo. A primeira linha global estabelecida foi o Tordesilhas entre Portugal e Espanha, em 1494, que impôs a legalidade e a vigilância distintamente da máxima para os outros “para além do Equador não há pecados” e mesmo na frase de Pascal, “três graus de latitude alternam toda a jurisprudência e um meridiano determina o que é verdadeiro…”. Um lado da linha vigora a verdade, a paz e a amizade e do outro lado da linha, a lei do mais forte, a violência e a pilhagem, o que fez silenciar uma vasta região do mundo colocando-os em estado de natureza.

ALINE REIS | 11 outubro 2022